Integrada nas atividades do Mês Internacional das Bibliotecas Escolares, este ano subordinado ao tema “Ler para a paz e harmonia globais”, decorreu, nos dias 25 e 26 de outubro, a Estafeta de Leitura da ESMT.
À semelhança dos anos anteriores, a atividade processou-se da seguinte forma: à hora indicada, os alunos estafetas saíram da sua aula para ler um pequeno texto a outra turma. Após terem deixado esse testemunho, os estafetas dessa segunda turma repetiram o mesmo procedimento com a terceira turma, e assim sucessivamente.
Eis os três poemas selecionados para esta atividade:
Ana Luísa Amaral |
Uma botânica de paz: visitação
Tenho uma flor
de que não sei o nome
Na varanda,
em perfume comum
de outros aromas:
hibisco, uma roseira,
um pé de lúcia-lima
Mas esses são prodígios
para outra manhã:
é que esta flor
gerou folhas de verde
assombramento,
minúsculas e leves
Não a ameaçam bombas
nem românticos ventos,
nem mísseis, ou tornados,
nem ela sabe, embora esteja perto,
do sal em desavesso
que o mar traz
E o céu azul de Outono
a fingir Verão
é, para ela, bênção,
como a pequena água
que lhe dou
Deve ser isto
uma espécie da paz:
um segredo botânico
de luz
Ana Luísa Amaral, in "O Olhar Diagonal das Coisas" (2022)
Natália Correia |
Ode à Paz
Pela verdade, pelo riso, pela luz, pela beleza,
Pelas aves que voam no olhar de uma criança,
Pela limpeza do vento, pelos actos de pureza,
Pela alegria, pelo vinho, pela música, pela dança,
Pela branda melodia do rumor dos regatos,
Pelo fulgor do estio, pelo azul do claro dia,
Pelas flores que esmaltam os campos, pelo sossego dos pastos,
Pela exactidão das rosas, pela Sabedoria,
Pelas pérolas que gotejam dos olhos dos amantes,
Pelos prodígios que são verdadeiros nos sonhos,
Pelo amor, pela liberdade, pelas coisas radiantes,
Pelos aromas maduros de suaves outonos,
Pela futura manhã dos grandes transparentes,
Pelas entranhas maternas e fecundas da terra,
Pelas lágrimas das mães a quem nuvens sangrentas
Arrebatam os filhos para a torpeza da guerra,
Eu te conjuro ó paz, eu te invoco ó benigna,
Ó Santa, ó talismã contra a indústria feroz.
Com tuas mãos que abatem as bandeiras da ira,
Com o teu esconjuro da bomba e do algoz,
Abre as portas da História,
deixa passar a Vida!
Natália Correia, in "Inéditos (1985/1990)
Eu trabalho às escondidas num pássaro. num pássaro rastejante debaixo da terra.
um pássaro sem asas nem pernas andantes.
que não canta. que não voa.
que não sabe que acima da terra
há outro mundo. que existe cá fora.
um pássaro castanho, de crista azulada. é aquela grande ave encantada em que trabalho às
escondidas. ele sonha como canta e sonha como voa.
e dos seus sonhos nasce, por vezes, a primavera.
no mundo sobre o qual nada sabe. no mundo cá fora,
com borboletas, com flores e trinados.
com amores, e despedidas, com bordados, sobre os quais o meu pássaro castanho sonha
como canta e sonha que sabe. sonha como voa.
mas da terra só a terra se vê cá fora.
Lucian
Vasilescu, in "Antologia de poesia romena contemporânea" (2019)