segunda-feira, 9 de abril de 2012

Luís de Sttau Monteiro


"Para mim há uma coisa sagrada: ser livre como o vento."




Luís Infante de Lacerda Sttau Monteiro é um dramaturgo incontornável do século XX português. Filho de Lúcia Rebelo Cancela Infante de Lacerda (1903-1980) e de Armindo Rodrigues de Sttau Monteiro (1896 – 1955), nasceu a 3 de abril de 1926, em Lisboa.
Em 1936, com dez anos de idade, partiu para Londres com seu pai, embaixador de Portugal. Em 1943, este último foi demitido do seu cargo por Salazar, pelo que regressaram a Portugal.
Estudou num colégio particular e no Liceu Pedro Nunes. Licenciou-se em Direito, que exerceu apenas durante dois anos. Regressou a Londres e tornou-se piloto de Fórmula 2. Foi aí que conheceu uma jovem inglesa, June Goodyear, com quem se casou em Sintra, em 27 de setembro de 1951.
Ao regressar a Portugal, colaborou em diversas publicações, destacando-se a revista Almanaque e o suplemento A Mosca do Diário de Lisboa. Neste último, escreveu crónicas de crítica de costume, sob a forma de redações escolares, sem qualquer pontuação, assinadas por uma adolescente, a Guidinha.* 
A sua estadia em Inglaterra, durante a juventude, pô-lo em contacto com alguns movimentos de vanguarda da literatura anglo-saxónica. Na sua obra narrativa retratou ironicamente certos estratos da burguesia lisboeta e aspetos da sociedade portuguesa sua contemporânea.
Estreou-se, em 1960, com Um Homem não Chora, a que se seguiu Angústia Para o Jantar (1961), obra que revela alguma influência de escritores ingleses da geração dos angry young men, que o consagrou, e E Se For Rapariga Chama-se Custódia (1966).
Destacou-se, sobretudo, como dramaturgo, nomeadamente com Felizmente há Luar! (1961), peça que, sob influência do teatro de Brecht e recuperando acontecimentos da anterior história portuguesa, procurava fazer uma denúncia da situação sua contemporânea. Esta peça foi publicada em 1961, tendo sido galardoada com o Grande Prémio de Teatro. A sua representação foi, no entanto, proibida pela censura. Só em 1978, após a Revolução do 25 de abril, a peça foi apresentada no Teatro Nacional.
O seu carácter contestatário levou a que fosse preso pela PIDE, em 1967, após a publicação num único volume das peças de teatro A Guerra Santa e A Estátua, sátiras em que criticava a ditadura e a guerra colonial.
Faleceu a 23 de julho de 1993, em Lisboa, tendo como «a única coisa sagrada ser livre como o vento».






Transcrevem-se, seguidamente, alguns excertos das Redacções da Guidinha*, publicadas pela Areal Editores.


"Estou farta de batatas até aos olhos não posso ver batatas à minha frente porque tenho um azar danado enquanto toda a gente hoje tem o DIA mundial da poupança eu nasci numa casa em que andamos há cinco anos ou mais sim ou mais que eu tenho a impressão de que nunca vivemos senão assim mas o melhor é voltar ao que eu estava a contar enquanto toda a gente tem o dia mundial da poupança nós lá em casa andamos no ANO inteiro da poupança e o pior é que já vamos para o quarto ano da poupança e para quê? para chegarmos vivos ao fim do mês vivos mas cheios de batatas até aos olhos (...) deviam dar uma medalha ao meu Pai porque ele é um homem bestial que inventou a tal poupança antes do resto do mundo cá para mim deviam pôr o retrato dele nos livros de história ao lado dos retratos dos navegadores porque ele descobriu a poupança antes dos outros sim porque a verdade é que a gente lá em casa anda a navegar em poupança antes dos outros há tantos anos que nem conhecemos outra coisa eu cá por mim estou à espera para ver se compro um livro de matemática porque com o dinheiro que o meu Pai ganha nem para o ano mas para voltarmos outra vez ao que eu estava a dizer o que eu quero é que ponham debaixo dos cartazes (do Dia Mundial da Poupança) «Viva o Pai da Guidinha que inventou o Ano da Poupança Doméstica» ou qualquer outra coisa parecida para se fazer justiça”





"Tretas tretas tretas a mim é que não me levam mais era o que faltava ou um ou outro é um aldrabão disseram-me que o pai natal descia pela chaminé e eu acendi o fogão para lhe queimar o rabo para ele dar um grito para eu o ver e nicles quem ficou com o rabo a arder fui eu que levei bumba no toutiço por ter gasto gás é só para ver como as coisas são disseram-me que ele trazia presentes do céu e o que ele me trouxe foi uma camisola que eu vi numa montra duma loja em saldo com o preço e tudo isto quer dizer que o Céu fica na Rua dos Fanqueiros ou que me aldrabaram por eu ser criança é o que eu digo mentem à gente mal a gente nasce e depois queixam-se de que a gente em grande queira ir para a política (...) outra porcaria que me fez o pai natal foi dizer ao meu pai que este ano os presentes eram fracotes por causa da crise que há no Céu mas então se aquilo é igual à Terra para que é que lhe chamam Céu anda a gente a privar-se de coisas para ir para o Céu e chega lá e bumba aquilo é como a Graça ou como o Areeiro eu é que não vou nisso e se as coisas não mudam para o ano faço de conta que não sei da crise e mando uma reclamação para o deputado que me representa na assembleia e o pai natal vai ver como é que as moscas picam para aprender a ser profissional a valer que isto dum pai natal amador não interessa a ninguém e muito menos a esta vossa GUIDINHA que não está cá por ver andar os outros."





A Guidinha e o 25 de Abril





Ficção
1960 - Um Homem não Chora
1961 - Angústia para o Jantar
1966 - E se for Rapariga Chama-se Custódia
1965 - A mulher que queria o fim do mundo

Teatro
1961 - Felizmente Há Luar!
1963 - Todos os Anos, pela Primavera
1965 - O Barão (1965, adaptação teatral da novela de Branquinho da Fonseca)
1966 - Auto da Barca do Motor fora da Borda
1967 - A Guerra Santa
1967 - A Estátua
1968 - As Mãos de Abraão Zacut
1971 - Sua Excelência
1979 - Crónica Atribulada do Esperançoso Fagundes




Bibliografia ativa na biblioteca
Felizmente há luar!


Bibliografia passiva na biblioteca
ÂNGELO, Paula - Felizmente há luar! [de] Luís de Sttau Monteiro : introdução ao estudo da obra. S. João do Estoril : Papelaria Bonanza, [199-?]. 84 p.
DELGADO, Isabel Teles Lopes - Para uma leitura de Felizmente há Luar! de Luís de Sttau Monteiro. 1a ed. Lisboa : Presença, 2000. 87 p.. ISBN 972-23-2580-9.
REIS, Fernando Egídio ; SANTOS, Maria Manuela Ventura ; GONÇALVES, Maria Neves L. - Felizmente há luar! de Luís de Sttau Monteiro : análise da obra. 3a ed. Lisboa : Texto, 2001. 96 p. ISBN 972-47-1496-9







1 comentário:

  1. É sempre gratificante a constatação do sentido de oportunidade, do empenhamento e da perspetiva de colaboração.

    A propósito da citação: "(...)livro como o vento" ou livre "como o vento"?
    :)

    ResponderEliminar